Compêndio I.
PARTE 1:
Te vi.
Você usava pulseirinhas no braço e tinha livros na mão.
Eu, camisa preta e medo no coração.
Não prestei atenção em você. Estava preocupada com meu desafio: dar aulas à noite, para o ensino médio. Mas,
Te vi.
Você perguntou se eu era aluna ou professora. Rssr.
E disse que eu parecia tanto uma de suas amigas que só poderíamos ser irmãs. Rsrsrs (de novo).
Não prestei atenção em você.
Não que você não fosse agradável, mas é que na época pouca coisa me interessava.
PARTE 2.
Primeira vez que te vi tocando violão.
Sensação boa. Segurança, afago, distante intimidade boba, comunicação em silêncio. Não pedi as músicas, mas você tocou mesmo assim.
Fechei os olhos. Mas foi, talvez a primeira vez que te vi. Foi como viajar em direção a um lugar tão distante.
Como uma dessas sensações suaves que de vez em quando e tão de repente nos surpreendem e nos arrebatam. Medo.
Abri os olhos...
PARTE 3.
Ontem conversamos demais! Nó!! Você não se lembra por que, na verdade, não estava lá (ou aqui). Curioso...
Passamos horas conversando, foi engraçado. Por que às vezes você fala demais e eu não consigo acompanhar.
Aí você diz que eu falo de menos. Não ligo. Você diz isso por que se sente culpado em ter esgotado o assunto. Bobo.
Falei que não gostava do escuro. E você reclamou de novo que o ano tá acabando e seu jardim não tá pronto.
Reclamamos juntos dos péssimos diretores que desperdiçam milhões e no final o filme fica uma porcaria.
E imaginamos finais melhores para todos os filmes ruins que assistimos.
Escolhemos umas música (briga!) e eu tentei te explicar por que Steven Spielberg é o melhor diretor, roteirista e produtor de toda a história do cinema, mas você é muito cabeça dura. Mudamos de assunto 62 vezes.
Disse pra eu deixar de preguiça e regar as plantas do quintal. Não quero! São do meu pai. Ele regue!
E voltamos a falar do meu cabelo. Meu Deus! Você reclamou por eu ter cortado o cabelo. Preferia ele compriiiiiiiiiiiiiiiido e cacheaaaaaaaaaaaado! Já entendi!
Vai crescer antes da primavera. Eu sei. Vai dar até flor. Begônias, hortências, margaridas e girassóis. Ah! Girassóis!
Você não admite, mas tem dificuldade em aceitar as opiniões que se diferem das suas. Tudo bem, muita gente é assim e convive bem em sociedade. Então nada de camisas de força por enquanto. Você riu de mim -de novo- quando eu disse que adorava quebra cabeças. Estou me preparando para o de 2.000 peças! Um feito na história!!
Ah! Não gosto quando ri de mim.
Deixamos um pouco de assunto para amanhã. Sempre deixamos um pouco de assunto para amanhã.
Você me chamou pra caminhar. Eu sugeri um passeio de bicicleta, ainda lembra como é?. Ok. Pra onde?
"Até onde a gente chegar. Numa praça na beira do mar. Um pedaço de qualquer lugar, nesse dia branco, se branco ele for...".
Se branco ele for...
Choveu. Belo! Nos calamos em devoção ao som das gotas.
Você cozinhou pra mim, e eu ri. Você recitou Neruda, e eu chorei. Você tocou Los hermanos e eu dancei.
E no fim de tudo foi impossível não pensar: "how I wish you were here"...
E não falamos nada sobre o mundo real, sobre o que acontece lá fora.
Será que "nós dois temos os mesmos defeitos" achamos que sabemos tudo ao nosso respeito... E é tão fácil achar isso, né?
Bobagens, bobagens, bobagens.
Melhor se fosse música. começaria com uns acordezinhos bobos, uns barulhinhos de vento, uma assobio pra terminar e pronto. Me fez feliz.
"Talvez amanha...
Talvez esse temporal saia do caminho.
Por hoje é só"
Estrela - Dez - 2011